quarta-feira, 18 de julho de 2012

Na cozinha

(10/07/2012)

Acabo de escutar uma notícia no jornal das 19hs: três cães foram abandonados numa casa; duas semanas sem alimento nem água. Duas semanas que não pouparam a vida de um dos cães. Diz o noticiário que ele não resistiu e acabou servindo de alimento para os outros dois. Há os que dirão que ele abdicou de sua vida em prol dos outros dois. Há ainda os que dizem que os dois cães semi-vivos avançaram, como cães que eram, e devoraram-no, e mataram a(a) fome. Eles estão vivos, mas paira em suas consciências uma certa intranquilidade. Eles não comem mais carne.



sábado, 14 de julho de 2012

Diário de trabalho: Uerla Cardoso - Em um dia sem data

As vezes os currais estão cheios, outras vazios, as vezes pela metade. Gosto da metade! o tanque transbordando pode perder alguma gota, um pensamento...sempre mais um.

"Sou um guardador de rebanhos,
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca".



Fernando Pessoa

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Pedra-olho

Diário de trabalho: Saulus Castro - 09.07.12


Existem as pedras e existem os olhos. Não há o que não exista. Se não há boi voador é porque não é boi...
Existe o frio e um arrepio que dá de quando em vez pra esquecer que somos vivos. Aqui não existe o que é. Nem o bem  nem o mal. Hoje existe o que poderia ter sido.
Existe a pedra-olho. Existe um buraco turvo que não se finda e nele existe tudo-nada.

Diário de trabalho: Uerla Cardoso 04/06/2012


Magma

A linha se enroscou nas juntas dos ossos,
emaranhou no nó do corpo caído, pisado, pó flutuante...
puxou em fios todas as vértebras da mente mágma,
vulcão humano de abismos  calados, ternos de cegueira, 
empreitada da ribanceira tênue,
efêmera mão poente...

quarta-feira, 11 de julho de 2012

SONETO DO RASO


"Que as histórias calem que mais não contem
As alturas da vida: imaginárias
Pois tudo é chão, é linha de horizonte
Em campos de fronteiras arbitrárias.
E se anule o que vai subindo o monte
Em sombra, em luz, que são versões contrárias
Ontem – depois, futuramente, ontem
Presenças de passados luminárias
Sobre as vertentes há escuro e aurora
Tudo, todo o existente é fundo, e aflora
Eterna flor mantida neste vaso
Onde se confundem o dentro e o fora
Com o cheio, o vazio se evapora
E o que resta é o fundo: o fundo raso".

Joaquim Cardozo

sábado, 7 de julho de 2012

A máquina de retroceder

Diário de trabalho: Saulus Castro - 06.07.2012 


Sobre o que é seco e velho. Sobre o que está longe de se permitir. O injustificável não voltar. Sobre aquele que já nasce com cem anos nos olhos e pouco enxerga de mudança.

"Nos princípios do século 20, o Uruguai era um país do século 21. No final do século 20, o Uruguai é um país do século 19.
No reino da chatice, os bons modos proíbem tudo aquilo que não é imposto pela rotina. Os homens sonham com aposentar-se e as mulheres com casar-se. Os jovens, culpados do delito de ser jovens, sofrem a pena da solidão ou do desterro, a menos que possam provar que são velhos."

O livro dos abraços, Eduardo Galeano

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Em um dia de mente...


                                   
Na margem de um trilho 

Onde encontro? Onde me acho? Tenho estado entre a encruzilhada de dois mundos, tenho sido chave torta para dois lados. De um lado um brilho que atravanca meus olhos para fora, do outro um ponto circular que traz a escuridão para minha face. Como saber qual dos dois é o caminho? Sendo que aqui onde me encontro existem tantos espinhos. E as extremidades de cada lado são tão longas... Infinitamente longas... Uma infinidade com dois brilhos opostos, um em cada ponta. GIRA CABEÇA! GIRA!É impossível decidir para quem meus olhos querem ser doados. Separa-te, una-te, separuna-te. Corpo- mente. Metade de ti é escuro-frio, e a outra metade é claro-quente. Definitivamente não sei para onde olhar, meu físico está cansado, meus olhos doem, não aguento mais me contorcer para que os dois tenham igualmente meus olhares. Ficarei aqui no meio de pálpebras fechadas, trazendo para minha retina as duas presenças, os dois  estados, as duas esferas, todas as sensações...

Uerla Cardoso